Friday, February 2, 2024

Beast in Heat (1977)




 Lançado em julho de 1977, The Beast in Heat é a obra mais insana de todo o nazi-exploitation. Com um conceito bizarro e execução incompetente em todos os quesitos, é apenas para os iniciados no gênero. Isso o torna um filme fascinante, e um exemplo das maiores qualidades e defeitos que esse tipo de cinema tem a oferecer.

O diretor Luigi Batzella (sob o pseudônimo Ivan Kathansky) não era um estranho ao gênero. Em janeiro daquele mesmo ano, havia lançado Achtung! The Desert Tigers, uma mistura de nazi-exploitation com men on a mission. Passado em um campo de concentração no deserto africano, Achtung! The Desert Tigers conta a história de um grupo de soldados americanos, liderados por seu major (o galã Richard Harrison), que tenta escapar das garras do cruel Comandante von Stolzen (o fisiculturista Gordon Mitchell) e libertar as moças do campo.

Exceto por algumas cenas de nudez e toques de sadomasoquistas por conta da médica do campo (interpretada por Lea Lander), Achtung! The Desert Tigers é em sua essência um filme de aventura. Batzella não era estranho ao gênero, tendo roteirizado When the Bells Toll (1970), fita de men on a mission cujo título tentava fazer uma alusão ao romance Por Quem os Sinos Dobram, de Ernest Hemingway (mais sobre esse filme ainda neste capítulo). Os toques de nazi-exploitation servem para chamar o público desse tipo de filme e, assim, chamar mais gente para as salas de cinema.

A grande curiosidade de Achtung! The Desert Tigers é a presença de Gordon Mitchell, famoso por interpretar heróis e deuses em filmes estilo sandália e espada. Mitchell voltaria ao nazi-exploitation no tardio Holocaust Part 2 (Angelo Pannació, 1988), mais uma vez no papel de um oficial nazista. Acima de tudo, Achtung! serve como um contraponto ao que Batzella iria fazer logo depois, naquele mesmo ano, com The Beast in Heat. Analisando-os lado a lado, fica difícil acreditar que foram feitos pelo mesmo diretor.



Já na primeira cena de The Beast in Heat, passada no laboratório da insana Dra. Ellen Kratsch (Macha Magall), Batzella mostra que este será um filme diferente do seu anterior. Os experimentos da cientista têm como objetivo criar um monstro com virilidade sobre-humana para ser utilizada em interrogatórios. Preso numa jaula, o monstro está sempre pronto para violentar até a morte qualquer mulher que lhe seja oferecida. E é exatamente o que acontece com cada uma das cobaias que a Dra. Kratsch usa para demonstrar a eficácia de seus métodos para os seus superiores.

A partir daí o filme passa a acompanhar os habitantes de uma vila tomada pelos nazistas, que organizam uma resistência para conquistar a sua liberdade. Entre eles, está Irene (Brigitte Skay), uma jovem prostituta que tenta arrancar informações de seus amantes nazistas. Os outros rebeldes organizam atentados contra os nazistas, que, em retaliação, promovem massacres no vilarejo. Ocasionalmente a trama volta para a Dra. Kratsch, que utiliza diversos métodos de tortura para arrancar informações dos rebeldes, recorrendo a castração, eletrocução e, é claro, aos serviços de seu monstro de estimação.

Tudo isso culmina em uma longa batalha entre os rebeldes e os nazistas. Entre mortos e feridos, eles conseguem chegar ao calabouço da Dra. Kratsch que, numa ironia do destino, acaba se tornando vítima do monstro que criou. Os momentos finais de The Beast in Heat ainda tentam criar alguma comoção e trazer uma mensagem anti-bélica. Mas a imagem de um homem carregando uma criança morta em meio a um bombardeio não funciona como deveria depois do festival de absurdos do resto do filme.

Em termos de qualidade cinematográfica, The Beast in Heat é um desastre completo. Erros de todo tipo se amontoam durante o filme inteiro. Alguns são primários, como a sombra do cameraman e seu assistente sendo projetadas no cenários. Outros chegam a ser intrigantes, como as tomadas como imagem invertida que fazem com que as suásticas fiquem ao contrário. Isso sem nem mencionar os absurdos do roteiro e as armas que atiram balas invisíveis que não deixam buracos nas suas vítimas.


A cena de batalha que acontece no clímax do filme é uma colagem de tiroteios mal coreografados, explosões sem sentido e uso indiscriminado de cenas retiradas de When the Bells Toll. Impossível não notar quando um personagem dispara sua metralhadora e atinge inimigos em um cenário completamente diferente, filmado em uma película muito mais granulada.

Os heróis rebeldes não possuem muito carisma, ficando até difícil distinguir um do outro. Os únicos que conseguem criar um pouco de simpatia são Irene e o padre do vilarejo (interpretado por Brad Harris). Mas o destaque de The Beast in Heat são seus dois principais vilões. A estonteante belga Macha Magall se diverte horrores na pele da sádica Ellen Kratsch. Magall, que faria um papel mais bem comportado em SS Girls, cria aqui uma das mais interessantes variações da Ilsa, e faz papel mais memorável de sua curta carreira.

O monstro criado por Kratsch é interpretado por Salvatore Baccaro, sob o pseudônimo de Sal Boris (uma homenagem a Boris Karloff). Baccaro foi uma das figuras mais interessantes do cinema italiano de gênero. Tendo nascido com acromegalia, doença que fazia com que suas mãos e cabeça crescessem de maneira desproporcionada, Baccaro tinha a aparência de um homem das cavernas, embora fosse tido por seus amigos e companheiros como um homem meigo e simpático. Trabalhando como vendedor de flores em frente a um estúdio cinematográfico, Baccaro foi recrutado como ator por conta de suas feições incomuns, e construiu uma carreira interpretando monstros, inclusive em Salon Kitty, The Beast in Heat e SS Girls. O ator morreu em 1984, aos 51 anos, por conta de uma complicação cirúrgica. Estava então se preparando para o seu primeiro papel mainstream, no filme O Nome da Rosa (1986), no qual foi substituído por Ron Perlman.

The Beast in Heat também recebeu diferentes títulos ao redor do mundo, alguns genéricos como Horrifying Experiments of the S.S. Last Days, outros mais poéticos como francês Quand explose la dernière grenade (“Quando explode a última granada”) e o curioso SS Hell Camp, sendo que o filme nem sequer se passa num campo de concentração. O filme foi filmado na comuna romana de Guidonia Montecelio, usando habitantes locais como extras.



O filme de Batzella entrou na lista dos video nasties na época, e não foi liberado para lançamento na Inglaterra nem mesmo com cortes. De fato, retirar as cenas de sexo e violência de The Beast in Heat resultaria apenas em um média metragem de guerra mal filmado e sem sentido, desagradando a gregos e troianos. A pouca história que o filme tem para contar não é muito interessante, e seu grande atrativo são as cenas extremas e apelativas. O resto é polpa.

The Beast in Heat é um festival de mau gosto e, ao lado de Ilsa, She Wolf of the SS e Gestapo’s Last Orgy, um dos filmes mais grotescos no nazi-exploitation. Mas enquanto esses dois últimos filmes são mais bem acabados, The Beast in Heat foi feito nas coxas, e não sabe se quer ser uma comédia de humor negro ou um libelo à paz. Batzella atira para todos os lados e acerta todos os alvos errados. Por conta disso, seu filme confunde o espectador, que não sabe nunca se deveria estar rindo ou chorando. E é essa bagunça que faz de The Beast in Heat um filme memorável


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