Friday, December 8, 2023

Love Camp 7 (1969) e Cut-Throat Comandoss (1969)


O cinema exploitation se caracteriza por explorar temas tabu que afrontam o público e os órgãos de censura. Comentários depreciativos por vezes eram utilizados na campanha de marketing, já que o público alvo geralmente estava em busca de emoções fortes e proibidas. Nesse quesito, o grande destaque eram os sexploitation, filmes que apresentavam sexo e nudez desenfreada de uma maneira que os filmes mainstream em sua maioria evitavam.
O nazi-exploitation é um entre diversos subgêneros de sexploitation, e seu primo mais próximo é o WIP, como eram conhecidos filmes de penitenciárias femininas. Nesse tipo de filme, a protagonista é enviada para a prisão por um crime que não cometeu, e lá sofre torturas, abusos e estupros, participa de lutas na lama e no chuveiro e tem que lidar com um(a) carcereiro(a) sádico(a). Alguns títulos de WIP incluem Barbed Wired Dolls (1976), A Prisão (1980) Chained Heat (1983) e Women's Prison Massacre (1985). Considerando as semelhanças entre os dois subgêneros, não chega a ser uma surpresa o fato de que Love Camp 7 foi também responsável por alavancar o sucesso dos WIP.


Em 1972, o British Board Film Classification (Comitê de Classificação de Filmes do Reino Unido) lançou a lista dos Video Nasties, 72 filmes proibidos de serem comercializados em VHS na Inglaterra por conta de excesso de violência, sexo, drogas ou todos esses elementos combinados. Dirigido por Lee Frost em 1969, o nazi-exploitation Love Camp 7 foi um dos Video Nasties originais, e quando, em 2002, foi submetido a uma nova classificação, a resposta do BBFC não foi nada simpática:
A BBFC recusou dar uma classificação para o vídeo de Love Camp 7. Love Camp 7 é um filme exploitation passado num ‘campo do amor’ nazista durante a Segunda Guerra Mundial. O filme contém numerosas cenas de mulheres prisioneiras sendo abusadas, torturadas e humilhadas por seus algozes nazistas. De fato o único propósito deste trabalho é convidar os homens na plateia a se deleitar com o espetáculo de mulheres nuas sendo humilhadas para seu prazer. Love Camp 7 contém momentos de violência sexual e associação de sexo com amordaçamento, dor e humilhação. Estas cenas entram em choque com a política deste comitê no que diz respeito à representação de violência sexual, o que inclui cenas que erotizam ou fazem apologia violação sexual. Consideramos a possibilidade de fazer cortes no filme. Entretanto, como a violência sexual domina o filme inteiro, cortes não são uma opção viável.
A reação do BBFC parece um tanto exagerada, considerando que Love Camp 7, além de ser o primeiro legítimo filme nazi-exploitation, também é um dos mais ingênuos. Isso não significa que os momentos de violência não sejam perturbadores e difíceis de assistir, mas a trama que os rodeia é aventuresca demais em comparação com outros exemplares do subgênero. É uma mistura estranha de uma produção de matinê feita para divertir com cenas de orgia e estupro, e o efeito é indigesto.
Love Camp 7 é narrado pelo Major Latham (James E. McLarty, misteriosamente não creditado), militar britânico envolvido em uma missão secreta durante a guerra com o objetivo de roubar os planos de um novo tipo de avião a jato alemão. O cientista responsável pelo projeto do avião está morto, mas sua secretária, Martha Grossman, ainda possui diversos detalhes preciosos para os Aliados. Grossman está detida no Love Camp 7, um local onde prisioneiras judias são forçadas a se prostituir para os oficiais alemães. Duas agentes britânicas, Linda Harman (Maria Lease) e Grace Freeman (Kathy Williams) são enviadas para serem feitas prisioneiras no Love Camp 7, onde devem fazer contato com Grossmann, memorizar os planos do jato, e escapar a tempo de serem resgatadas por membros da resistência.
O Love Camp 7 é dirigido por um sádico Comandante (o também roteirista e produtor Bob Cresse) que comanda o local com mão de ferro, e usa qualquer desculpa para abusar dos corpos de suas prisioneiras. As duas agentes logo descobrem que a missão não vai ser fácil, e passam por diversas humilhações até conseguirem encontrar Grossmann e obter o que vieram procurar. A fuga do campo se dá em meio a sexo e sangue, e Grace Freeman é morta antes de conseguir matar o Comandante. Linda Harman sobrevive, trazendo Martha Grossman e os planos do avião, filme termina com a revelação de que a agente se casou com o Major Latham, e que agora vive com ele em Londres.


Apesar de ser dirigido por Lee Frost (assinando como R.L. Frost), Love Camp 7 é acima de tudo um projeto de Bob Cresse, que assina o roteiro e produção como R.W. Cresse. Nascido em 1936 e falecido em 1988, Cresse não apenas era um péssimo ator e um péssimo roteirista, mas aparentemente, um péssimo ser humano. Colegas do ramo cinematográfico o consideravam um misógino desprezível, não muito distante dos personagens que gostava de escrever e interpretar. Reza a lenda que ele possuía um espelho de face dupla no seu escritório pelo qual podia espiar o lavabo feminino do seu escritório. Sua especialidade eram filmes exploitation da mais baixa categoria, onde, muitas vezes, também atuava, improvisando a maior parte das suas falas.
Em algum ponto no início dos anos 1970, pouco depois do sucesso do lançamento de Love Camp 7, Cresse estava levando seu cachorro para passear quando viu dois homens aparentemente assaltando uma mulher indefesa. Cresse tinha uma arma, e tentou render os assaltantes, mas acabou levando um tiro na barriga. Os assaltantes, que na verdade eram policiais prendendo uma prostituta, atiraram na cabeça do cachorro de Cresse por puro despeito. As contas médicas o levaram a falência, e decretaram o fim de sua carreira como produtor. Se não fosse por esse incidente, é bem provável que Cresse tivesse bolado mais roteiros no subgênero para tentar faturar em cima do próprio sucesso. Seu último papel como ator fora em The Erotic Adventures of Zorro, (1972) versão pornô softcore do famoso herói, onde Cresse interpretou o vilão Sargento Garcia.
Lee Frost (nome artístico de David Caine), diretor de Love Camp 7, era um cineasta genuinamente exploitation, tendo trabalhado em diversos pornôs softcore e documentários falsos do estilo mondo. Estas eram produções baratas que combinavam imagens de arquivo e cenas encenadas para representar situações bizarras com o pior da humanidade. Sua parceria com Bob Cresse começou com The Animal (1968) e rendeu mais cinco filmes, incluindo Love Camp 7. Em 1975, quando o nazi-exploitation começou a alçar voos mais altos, Frost escreveu e dirigiu The Black Gestapo, que apesar do título picareta não se encaixa no subgênero que ele ajudou a criar. Frost abandonou o cinema nos anos 1990, decepcionado com os rumos que a indústria havia tomado, e faleceu em 2007 de um ataque no coração.
Maria Lease, intérprete da heroína Linda Harman, foi a única membra do elenco que conseguiu seguir uma carreira sólida no mundo do cinema. Tendo estrelado em diversos filmes exploitation e pornôs softcore desde 1968, Maria começou a acumular diferentes funções e aprendeu o suficiente para poder abandonar a função de atriz em 1972 e ganhar a vida trabalhando por trás das câmeras. Em 1978, Maria estreou como diretora com as produções de sexo explícito Soft Places e Little Girls Blue, tendo co-redigido este último. Seus créditos mais recentes são de supervisora de script nos seriados O Desafio (1997-2004) e Justiça sem Limites (2004-2008).
Além de ser o primeiro filme a apresentar um campo do amor, Love Camp 7 apresentou diversos outros clichês que voltariam a dar as caras em futuros filmes nazi-exploitation. O mais reaproveitado é, provavelmente, a figura do nazista dissidente, que não aceita as torturas e humilhações sofridas pelas prisioneiras, e se rebela contra os seus oficiais. Ele aqui é representado pelo Sargento Gotthardt, interpretado por Warren James - que também fez contribuições não-creditadas ao roteiro. Ele é o protótipo de personagens como o Capitão Klaus Berger de Nazi Love Camp 27, e funciona como uma tábua de salvação representando um pouco de humanidade em meio à barbárie cometida por seus colegas.
Love Camp 7 é geralmente considerado o primeiro filme de nazi-exploitation já feito, mas, também em 1969, o cineasta John Hayes produziu, escreveu e dirigiu The Cut-Throats (também conhecido como SS Cutthroats, Cut-Throat Kommandoss, e She Devils of the SS). O filme que combina elementos do subgênero Men on a Mission (onde um grupo de soldados é enviados para cumprir uma missão altamente perigosa em território inimigo) com altas doses de nudez, violência e sexo.
Mesmo que filmes do tipo raramente prezem por um bom roteiro, The Cut Throats consegue possuir uma das tramas mais desconexas do nazi-exploitation. A incoerência já começa com os créditos, que são reproduzidos sobre a imagem de um soldado com chapéu de caubói praticando o seu laço, ao som da canção country Ballad of Jimmy Johnson. Esta introdução parece estabelecer que o herói será o soldado Johnson, interpretado por John Keith, mas o personagem é morto numa troca de tiros com um alemão nos primeiros cinco minutos de filme.
A trama então se foca no pelotão de soldados comandados pelo Capitão Franklin B. Kohler III (E.J. Walsh, em seu único crédito) que tem como missão invadir uma base nazista e eliminar os inimigos sem fazer prisioneiros. Assim que cumprem a missão, os soldados descobrem um grupo de mulheres alemãs dentro da base, que, agradecidas, lhes oferecem entretenimento com um show de vaudeville e favores sexuais. Enquanto os soldados estão distraídos, o Capitão Kohler vai atrás do seu verdadeiro objetivo: um baú de jóias de valor inestimável mantido num esconderijo secreto na base. Disposto a tudo para tomar posse da fortuna, Kohler chega a trair os seus próprios inimigos e fazer um acordo com o general nazista Heiss (Rodger Steel - mais sobre esse ator abaixo).


A trama simples é entrecortada por inúmeras cenas de sexo tediosas e deslocadas. A única que parece fazer algum sentido acontece no início do filme, quando uma mulher (Sandy Carey) tenta vender um quadro para um nazista (Michael Pataki, de Halloween IV(1985)) que tenta estuprá-la e é defendida por soldados americanos. Outras, envolvendo massagens eróticas e saunas poderiam (e deveriam) ser cortadas completamente, o que só melhoraria o ritmo e deixaria o filme mais curto. Outra cena de sexo completamente aleatória, envolvendo alemães comemorando o fim da guerra, vale pela curiosidade de conter uma participação da sueca Uschi Digard, que mais tarde apareceria em Ilsa, She Wolf of the SS (1975).
John Hayes foi um cineasta no mínimo eclético, tendo trabalhado em uma profusão de gêneros, do horror à ficção científica e comédia escrachada. Ele já havia abordado o tema da Segunda Guerra Mundial com Shell Shock (1964), mas The Cut-Throats é seu único nazi-exploitation legítimo. Considerando que Hayes não se apegava a nenhum gênero, e gostava de fazer de tudo um pouco, chega a ser irônico o fato de ele ter ajudado a fundar o nazi-exploitation, provavelmente sem jamais ter se dado conta disso.
Não há registros claros sobre qual filme estreou primeiro, Love Camp 7 ou The Cut-Throats. Mas considerando que Hayes lançou quatro filmes em 1969, ao passo que Lee Frost lançou apenas dois; e também considerando que, Love Camp 7, mesmo não sendo nenhum épico, ainda assim possui uma produção e roteiro mais bem cuidados do que The Cut-Throats, podemos inferir que o Love Camp 7 foi escrito e filmado antes do filme de Hayes.
Love Camp 7 e The Cut-Throats têm outra coisa em comum: a preciosa colaboração de Rodger Steel, colecionador de memorabilia de guerra nazista que havia viajado para a Alemanha depois da vitória dos Aliados para coletar itens militares para seu museu particular. Ou seja, uniformes, armas e objetos de decoração utilizados nesses dois filmes são em grande parte originais da guerra, e foram fornecidos pela companhia de Steel, Hollywood Military Hobbies. Steel, que se gabava de possuir, entre outras coisas, a prataria oficial de Hitler, foi recompensado com pequenos papéis de oficiais nazistas em Love Camp 7 e The Cut Throats, além de servir como consultor de produção.
Começando com essas duas produções pequenas e de baixa qualidade, o nazi-exploitation não se mostrava muito promissor. Mesmo que Love Camp 7 tenha tido um bom retorno de bilheteria, não era uma fundação sólida o bastante para criar um subgênero com regras e características definidas. Foi com o enorme sucesso de Ilsa, She Wolf of the SS em 1975 que tornou rentável produzir esse tipo de filme.
Mas antes de falar sobre Ilsa, é necessário citar dois outros filmes, lançados antes deste. O primeiro deles é uma pequena gema que possui a distinção de ser o único nazi-exploitation direcionado ao público alemão. Estamos falando de Fräuleins in Uniform (1973), uma comédia erótica dirigida por Erwin C. Dietrich; um filme absolutamente único nesse filão.
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